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O GLAUCOMA, A TENSAO OCULAR E A CANABIS

by Eunice Veloso on Aug 14, 2024

Na década de setenta a canábis era chamada “o remédio da avó para os olhos”.

O remédio era canábis e a doença dos olhos é  o glaucoma. Hoje se calhar já não lhe chamam o “remédio da avó para os olhos”. 

Até existe um medicamento de farmácia.

Em Portugal, o glaucoma é uma das doenças para qual é recomendada a  terapêutica à base de canábis medicinal, com prescrição médica, no caso do paciente resistir á terapêutica convencional.

Já existem fármacos à base de canábis. Será um sinal que que já há pesquisa mais conclusiva? E portanto benéfica para os que padecem de glaucoma?

Vamos ver. Se é assim ou não.

Já sabemos que a canábis não é inócua: tem de luz e tem de sombra, tal como o dia. Tal como tudo o que existe na natureza.

A questão é, se no caso do glaucoma a balança está equilibrada, na questão dos riscos versus benefícios.

Vamos “cavar” um pouco e revelar os riscos e os benefícios. Pelos menos os que são conhecidos.

 

ANTES DE MAIS NADA: O QUE É O GLAUCOMA?

O glaucoma é uma doença progressiva dos olhos na qual as células da retina vão sendo destruídas e o nervo óptico vai sendo danificado com o tempo: numa fase inicial reduz a visão periférica. Numa fase muito avançada pode levar à cegueira.

Estão identificados 3 factores que ocorrem em indivíduos com o risco de desenvolver o glaucoma:

  1. Idade
  2. Raça
  3. Pressão intraocular elevada

 

SERÁ QUE A CANÁBIS MEDICINAL  É EFICAZ NO TRATAMENTO DO GLAUCOMA?

Se pegarmos no termo “eficaz no tratamento do glaucoma” quando nos referimos à canábis: a resposta curta é não.

Porque a eficácia de um tratamento pressupõe que os seus efeitos sejam reflectidos num espaço de tempo relativamente prolongado no tempo e  que os benefícios superem os riscos. Não é o caso da canábis prescrita para o glaucoma.

E se a curiosidade for pouca: a leitura vai ficar por aqui.

Mas se quiser saber um pouco mais para poder avaliar melhor potenciais tratamentos que lhe sejam apresentados á base de canábis, com um mínimo de conhecimento: vai continuar a ler.

Canábis Medicinal e Glaucoma em Portugal

Mas o que é considerado canábis medicinal?  São medicamentos, preparações e substâncias químicas feitas á base de canábis e/ou componentes sintéticos da canábis, que são usados para fins medicinais.

Toda a cadeia de produção da canábis, desde o cultivo à  preparação e distribuição é controlada por forma a garantir a qualidade e segurança dos produtos finais.

Na maior parte do países em que a canábis medicinal é legalmente prescrita para condições médicas, o glaucoma está incluído.

No caso de Portugal em específico, os médicos estão autorizados a prescrever canábis em determinadas condições médicas definidas por lei e apenas quando a medicação convencional  não tem efeitos ou os efeitos adversos são relevantes.

Os casos previstos na lei portuguesa são estes:

  • Espasmos associados à esclerose múltiplas ou lesões da medula espinal;
  • Náuseas e vómitos resultantes  da quimioterapia, radioterapia, terapia de HIV, e medicação para a hepatite C;
  • Estimulação do apetite, para doentes de SIDA ou doentes oncológicos;
  • Dor crónica associada a doenças oncológicas ou ao sistema nervoso;
  • Glaucoma, que é o assunto deste artigo.

Que Efeitos Tem A Canábis Sobre O Glaucoma

A canábis tem efeitos sobre o glaucoma mas não é eficaz.

Desde a  década de 70 que vários estudos verificam que os canabinoides  reduzem significativamente a pressão intraocular, que é um dos factores mais importantes a ter em conta no glaucoma.

De  2006 para cá foram feitos estudos comparativos do THC (tetrahidrocanabinol, o canabinóide psicotrópico da canábis) e do CBD (canabidiol, o  canabinóide não-psicotrópico da planta) e os resultados são destes sobre  a pressão ocular:

-  doses baixas de CBD não surtem quaisquer efeitos sobre a pressão ocular;

-  doses elevadas de CBD (40 mcg) aumenta a pressão na retina;

-  o THC  tem melhores efeitos pois diminuiu a pressão intraocular até 40%  em qualquer das formas: por injecções intravenosas,  fumado, inalado ou ingerido;

-  por outro lado os pacientes tratados com THC ficaram drogados (cognição comprometida, “high”);

gotas de THC para os olhos foram ineficazes para o glaucoma, causando comichão ou u sensação de ardor nos olhos;

-  os efeitos do THC sobre o glaucoma duraram pouco mais que 1 ou 2 horas.

 

Resumindo: os canabinoides, mais especificamente,  o THC tem efeitos sobre o glaucoma, pela redução da pressão intraocular, mas não é um tratamento eficaz já que os seus efeitos são de muito curta duração.  

 

Glaucoma:gotas de THC para os olhos foram ineficazes

O LADO SOMBRA NA RELAÇÃO CANÁBIS - GLAUCOMA

Se o THC baixa  a pressão intraocular? Sim.

Mas é de curta duração. E o glaucoma é uma condição crónica que piora com o tempo. Para impedir que o glaucoma piore seria necessário tomar THC em intervalos regulares, em média, de duas em duas horas, cerca de 8 vezes por dia.

Para reduzir o pressão intraocular de uma forma visível e manter essa redução seria necessário ingerir cerca de 18-20 mg de THC, 6 a 8 vezes por dia. Todos os dias. E ingerir essa quantidade levada de canábis iria afectar, de forma dramática, o humor, a clareza mental e a saúde dos pulmões (caso fosse fumada).

E estar permanentemente sob os efeitos do THC tornaria impossível executar as tarefas do dia-a-dia como conduzir, tomar decisões or manter o foco no trabalho. Isso seria disruptivo, irrealista,  pouco práctico e ineficaz  para continuar a ter uma vida minimamente funcional. E o glaucoma tem que ser gerido 24 horas ao dia.

Mas há várias outras desvantagens, no tratamento do glaucoma com canábis, para a saúde dos olhos e para a saúde em geral.

 

A Maior Parte dos Oftalmologistas Não Recomenda

Alguns aspectos negativos de um hipotético tratamento com canábis para controlar o glaucoma já foram referidos. Mas há mais.

A canábis reduz a pressão sanguínea mas isso acontecendo diminui o fluxo de sangue para o nervo óptico: e aqui contraria os efeitos positivos da canábis no abaixamento da pressão intraocular.

Outro aspecto problemático é que vários pacientes do estudos reportaram  que se sentiram desconfortavelmente ansiosos após a toma dos canabinoides, com coração a disparar.

Este efeito é particularmente problemático para pessoas de risco de doenças cardiovascular e enfartes. E há os idosos, cujo factor de risco de desenvolver o glaucoma é a idade avançada  e estes dificilmente toleram os efeitos psicoactivos da canábis.

 

Para sintetizar este assunto Glaucoma-Canábis:

  • A maior associação mundial de oftalmologistas e cirurgiões não apoia o tratamento de canábis ou dos seus derivados para o tratamento do glaucoma.
  • Não se automedique com canábis numa tentativa de tratar o glaucoma. Corre o risco de perder a visão se não procurar um tratamento fiável e eficaz para tratar o glaucoma
  • Procure um oftalmologista que lhe apresente as melhores alternativas de tratamento para si.
  • Se for consumidor regular de canábis: reporte esse hábito ao seu médico de família

 

Este é o cenário para o glaucoma.

A canábis não é a solução para já.

Seria interessante que a investigação cientifica tivesse uma abordagem virada para desenvolver terapias de tratamento do glaucoma, que protejam e recuperem o nervo óptico dos danos ou que restaurem o fornecimento de fluxo sanguíneo.

E é possível que num futuro mais próximo consigam isolar um canabinóide que  não seja o THC ou produzir canabinóides sintéticos análogos que dure mais tempo e tenha menos efeitos secundários.

Até lá, os tratamentos convencionais, quer sejam medicamentos (usados numa fase inicial da doença) ou a cirurgia, ultrapassam em performance qualquer medicamento à base de canábis,

 

Referências:

https://www.medicare.pt/mais-saude/prevencao/canabis-medicinal (2024)

https://www.aao.org/eye-health/tips-prevention/medical-marijuana-glaucoma-treament (2023)

https://ophthalmology.wustl.edu/is-marijuana-a-treatment-for-glaucoma/ (2023)

https://assileye.com/blog/does-weed-help-glaucoma/ (2022)

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK224386/ (2001)

 

AVISO: ESTE ARTIGO NÃO TEM NENHUMA PRETENSÃO DE SER UM CONSELHO DE SAÚDE, É MERAMENTE INFORMATIVO, PELO QUE QUAISQUER INICIATIVAS QUE TENHA, RELATIVAMENTE À CANABIS MEDICINAL, DEVEM PASSAR SEMPRE PELO CONSELHO DO SEU MÉDICO ASSISTENTE.

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