O USO DA CANABIS AFECTA A PERSONALIDADE DO INDIVIDUO?
by Eunice Veloso on Nov 13, 2025
Tudo o que consumimos — do alimento à informação, passando por substâncias recreativas ou medicamentosas — impacta profundamente a bioquímica do nosso organismo, moldando a forma como percebemos o mundo, a nós próprios e, consequentemente, a nossa maneira de reagir aos contextos vivenciais.
Pensemos no vinho: pode ser um hábito cultural de convívio social ou degenerar num distúrbio. Pensemos na medicação: pode melhorar a qualidade de vida, mas o desequilíbrio na balança risco-benefício pode ser devastador. Em ambos os casos, o impacto na personalidade é inegável.
Este princípio universal foi resumido pelo médico Paracelso no século XVI:
“A diferença entre o remédio e o veneno está na dose.”
A canábis não é excepção a esta regra.
Longe de ser inócua, ela possui o potencial de trazer benefícios terapêuticos ou, se mal utilizada, transformar-se num vício. Neste artigo, vamos explorar a questão central: Pode o uso da canábis afetar ou alterar a personalidade de um indivíduo? A resposta, como veremos, reside definitivamente no contexto e, crucialmente, na forma e quantidade que a usa.
#1. Como a Canábis Pode Afectar a Personalidade Positivamente
A relação entre o uso de canábis e a personalidade é complexa e não linear. Embora a investigação se concentre muitas vezes nos riscos, existem relatos de utilizadores que experienciam efeitos percebidos como positivos na sua disposição e interacção social.
Muitos descrevem um efeito de relaxamento e euforia, que pode temporariamente reduzir a ansiedade social, facilitando a convivência e a abertura a novas experiências.
De acordo com um estudo da UNM (University of New Mexico), foi sugerido que o uso de canábis poderia levar as pessoas a serem "mais simpáticas" (nicer), indicando uma potencial melhoria na pro-socialidade ou empatia em certos contextos.
Esta mudança positiva pode manifestar-se como uma redução da reactividade emocional, permitindo ao indivíduo responder aos contextos vivenciais de forma mais calma e ponderada, em vez de reagir impulsivamente.
Para alguns, a canábis é utilizada como uma forma de automedicação para atenuar a hiperexcitação ou perturbações de humor ligeiras, proporcionando uma pausa mental que pode ser interpretada como um traço de personalidade mais tranquilo ou chill.
No entanto, é fundamental sublinhar que estes são efeitos percebidos e dependentes da dose e do contexto individual.

#2. Como a Canábis Pode Afetar a Personalidade Negativamente
O uso crónico e desregulado da canábis pode desencadear uma série de consequências que alteram negativamente a disposição e o comportamento do indivíduo. O consumo prolongado está frequentemente associado a um declínio no desempenho cognitivo, académico ou profissional, que pode manifestar-se como apatia ou uma profunda falta de motivação em relação aos objectivos de vida. Esta inacção pode ser percebida como uma alteração da personalidade, onde a proactividade e a ambição dão lugar à passividade e ao desinteresse.
Além disso, o uso da substância, especialmente em doses elevadas, pode exacerbar problemas de saúde mental subjacentes, como transtornos de ansiedade e de humor, resultando em traços de personalidade aumentados como o nervosismo ou a irritabilidade.
O artigo da Revista de Psiquiatria Portuguesa (ScienceDirect) estabelece uma ligação entre o consumo de canábis e traços de narcisismo. Contudo, é altamente questionável a implicação de que o hábito de canábis cria narcisistas. O desenvolvimento de traços narcísicos resulta de uma complexa combinação de alguma eventual predisposição genética e experiências ambientais precoces na infância (trauma, negligência ou excesso de indulgência), que moldam a formação do sistema nervoso. A escolha do hábito de consumo é, muito provavelmente, um mecanismo de enfrentamento (coping mechanism) que o indivíduo usou para lidar com contextos emocionais desafiantes.

#3. Quais São os Traços de Personalidade de Uma Pessoa Viciada em Canábis
O vício em canábis (Transtorno do Uso de Canábis) manifesta-se através de padrões de comportamento e traços de personalidade que reflectem a dependência da substância. Uma pessoa viciada demonstra tipicamente uma perda de controlo sobre o uso, continuando a consumir apesar das consequências negativas significativas, sejam elas sociais, profissionais ou de saúde.
A investigação da UNE (University of New England) aponta que, entre os indivíduos que desenvolvem dependência, é comum observar traços de personalidade relacionados com a impulsividade e a busca de sensações de risco.
Estes indivíduos podem ser menos propensos à conformidade e apresentar uma tendência para a desinibição ou para ignorar regras sociais. O vício leva a uma preocupação obsessiva com a obtenção e uso da canábis, o que resulta numa alteração das prioridades e num isolamento social progressivo, pois as actividades que antes eram prazerosas são substituídas pelo consumo.
Embora o uso crónico possa levar à apatia e à desmotivação, a origem do vício reside muitas vezes em traços subjacentes de personalidade que tornam o indivíduo mais vulnerável.
O padrão de dependência intensifica a instabilidade emocional e a dependência da substância como mecanismo de coping, dificultando a capacidade de gerir o stress e as emoções de forma autónoma. Estes traços não são criados pela canábis, mas sim amplificados e reforçados pela dependência instalada.
#4. Conclusões
A canábis é uma "faca de dois gumes": um potencial remédio ou um veneno, conforme a sabedoria de Paracelso nos lembra. A sua capacidade de afectar a personalidade depende crucialmente da dose, da frequência e do contexto psicológico do utilizador.
Embora possa proporcionar relaxamento e até maior empatia em alguns, o seu uso crónico e descontrolado pode levar a desmotivação e agravamento de distúrbios de ansiedade ou humor.
A chave para mitigar os riscos reside na consciência e no equilíbrio, reconhecendo que a diferença entre o benefício e o prejuízo está, invariavelmente, na dose.
Em caso de dependência estabelecida, é fundamental recorrer à ajuda profissional. O tratamento ideal deve ser holístico e integrado, visando não apenas o desmame da substância, mas, sobretudo, a resolução das questões emocionais subjacentes que estão na origem do distúrbio ou que servem de mecanismo de coping.
Note-se que a canábis medicinal, nomeadamente o canabidiol (CBD), tem sido estudada para atenuar a ansiedade e auxiliar no processo de desmame em casos de vício.
REFERÊNCIAS:
Escrito com a ajuda da IA
https://news.unm.edu/news/new-study-suggests-using-cannabis-can-make-you-a-nicer-person
https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0034745023000847
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https://www.hempathiclight.com/blogs/news/cbd-apoio-natural-para-ataques-de-panico
AVISO: Este artigo tem carácter unicamente informativo e não deve ser interpretado como aconselhamento médico. Qualquer decisão relacionada ao uso de canábis medicinal deve ser tomada exclusivamente sob orientação do seu médico assistente.